BEM NO MUNDO
Brasileiros criam modelo para avaliar possibilidade de vida em lua de Júpiter
Europa, a lua gelada de Júpiter, tem sido um dos principais alvos de interesse da Astrobiologia, como um possível ambiente habitável no Sistema Solar. Isso porque tem, debaixo de uma crosta de gelo com estimados 10 quilômetros de espessura, um oceano de água líquida com mais de 100 quilômetros de profundidade. Uma importante fonte de energia, decorrente da interação gravitacional com Júpiter, mantém essa água aquecida. Por isso, Europa tornou-se um objeto tão interessante. E a Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, está planejando uma missão, provavelmente para os anos 2030, com o propósito de estudar a habitabilidade e indícios de atividade biológica no oceano líquido do satélite. Trata-se de um projeto real, já em andamento. Uma pesquisa teórica, voltada para a avaliação da habitabilidade microbiana em Europa a partir de dados colhidos em ambientes análogos existentes na Terra, foi realizada por um grupo de pesquisadores brasileiros: Thiago Altair Ferreira, Marcio Guilherme Bronzato de Avellar, Fabio Rodrigues e Douglas Galante. O artigo, assinado pelos quatro, acaba de ser publicado em Scientific Reports. O estudo foi apoiado pela FAPESP por meio do Projeto Temático “O Sistema Terra e a evolução da vida durante o Neoproterozoico”, da Bolsa de Pós-doutorado “Estrelas compactas em binárias: investigando a composição da matéria superdensa” e da Bolsa de Mestrado “Ambientes radioativos naturais como fontes de desequilíbrio químico local e suas potenciais implicações prebióticas”. “O que fizemos foi explorar os possíveis efeitos de uma fonte de energia biologicamente aproveitável em Europa, com base em informações obtidas em contexto terrestre análogo”, disse o coordenador do estudo, Douglas Galante, pesquisador do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) e do Núcleo de Pesquisa em Astrobiologia (NAP-Astrobio) do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), à Agência Fapesp.
BACTÉRIA NA MINA
O contexto terrestre análogo foi encontrado na mina de ouro de Mponeng, na África do Sul, localizada a 2,8 quilômetros de profundidade. Nela, descobriu-se recentemente a bactéria Candidatus Desulforudis audaxviator, que sobrevive sem luz solar a partir da hidrólise radioativa da água. “Nessa mina subterrânea de grande profundidade, há rachaduras por onde vaza água com a presença de urânio radioativo. O urânio quebra as moléculas de água produzindo radicais livres [H+, OH- e outros]. Os radicais livres atacam as rochas do entorno, especialmente a pirita [dissulfeto de ferro, FeS2], produzindo sulfatos. E as bactérias utilizam os sulfatos para sintetizar ATP [trifosfato de adenosina], nucleotídeo responsável pelo armazenamento de energia nas células”, descreveu o pesquisador. “Foi a primeira vez que se observou um ecossistema que subsiste diretamente com base na energia nuclear.” Segundo Galante e colegas, o ambiente colonizado por bactérias na mina de Mponeng é um excelente análogo do ambiente presumivelmente existente no fundo oceânico de Europa. “Estudamos como os parâmetros encontrados em Mponeng poderiam ser transpostos para Europa de forma que a lua de Júpiter também apresentasse condições de abrigar ecossistemas semelhantes”, disse Galante. O primeiro e mais óbvio requisito é a existência de água líquida. A presença de um oceano líquido subterrâneo em Europa deve-se à “força de maré” exercida pela poderosa atração gravitacional de Júpiter. Diferentemente da Lua terrestre, cuja órbita é quase circular, Europa descreve uma trajetória elíptica muito excêntrica. Por isso, sofre deformação geométrica periódica ao longo do percurso. Quando se aproxima do planeta, sua forma é esticada pelo fortíssimo puxão gravitacional. Quando se afasta, sua forma volta a encolher.
(com Agência Fapesp)
02/02/2018
02/02/2018 18:20